para Tavinho Paes
de
repente você para na tela intermediária
entre
um canal e outro da TV.
concentre-se
nesse chiado
- é um
portal.
shczzsxxxfsschhhhhhfsxxshhsfshchxx
I.
Hiroshima, mon amour
Alain
Resnais e sequencias em preto e branco.
a bomba
de fissão de urânio lançada em 6 de agosto de 1945 sobre a cidade japonesa se
chamava Little Boy
-
pequenos garotos órfãos de todas as guerras -
Little
Boy e a doce ironia americana.
em 1969
um astronauta hasteou a bandeira
dos
Estados Unidos da América
em solo
lunar.
Guerra nas Estrelas
e suas
espadas de neon.
neon
dos letreiros japoneses,
da
Broadway, de Las Vegas
- há
muitas cidades de neon ao redor do mundo.
e As Cidades Invisíveis de Italo Calvino,
de
pessoas-livro como em Fahrenheit 451,
e a City Lights Books de Lawrence
Ferlinghetti.
e há
você zapeando canais,
e
apagando as fronteiras do mapa
com
lápis-borracha.
II.
Sherlock
Holmes, detetives de filme Noir e Inspetor Bugiganga se encontram num café de
Paris ou Buenos Aires, entre cafés e cigarros, e resolvem criar uma
força-tarefa para compreender a existência humana.
- “isso não é mais assunto para filósofos e
poetas”,
diz um deles.
- “esses pulhas não deram conta do recado”, completa outro
soltando uma baforada de fumaça ao melhor estilo noir.
em uma
mesa próxima, metido num sobretudo, chapéu sobre os olhos, você observa a
cena e anota tudo num caderninho de capa
de couro azul-marinho; se eles desvendarem o sentido da vida,
você
será o primeiro a saber.
III.
nós não
caímos na toca do coelho
nem
vimos o sorriso do gato de Alice.
descemos
para comprar cigarros,
paramos
numa esquina,
e
cavamos um buraco no chão,
atravessando
o centro da terra até sair do outro lado.
foi
como chegamos no Japão.
neom,
neom, neom
-
entoamos o mantra da moderna civilização -
neommmmmmmm...
na
ordem secreta do Kaos
você é
um deus que dança
humano,
demasiado humano.
IV.
de
repente,
ficamos
extraordinariamente ricos:
herdamos
“5 mil quilômetros quadrados
na
Antártica, um velho elefante de circo
e
manuscritos de alquimia”.
“quando eu morrer,
o cavalo preto ficará sem casa e vai sofrer
muito”,
lamentou
Clarice.
também
herdamos seu cavalo selvagem.
somos
extraordinariamente ricos
e damos
a volta ao mundo
cavando
buracos na terra
como
toupeiras.
quando
morrermos,
alguém
herdará
nossos
labirintos subterrâneos.
V.
enquanto
escavamos nossas tocas
com
passagens e rotas de fuga,
na
superfície da terra,
continuam
erguendo muros.
da
Muralha da China ao Muro de Berlim,
bloqueios
sempre servem ao controle militar.
em
2011, no Egito,
a junta
militar ergueu muros
em ruas
da cidade
para
impedir o trânsito de rebeldes.
atravessá-los
é missão para toupeiras:
nós
passamos por baixo.
VI.
desde
que o homem colonizou a Lua,
ela
deixou de ser assunto para poetas.
a NASA
invadiu o poema.
Little
Boy contaminou o poema.
Marilyn
Monroe desbancou
a
passante de Baudelaire
-
Hollywood virou a nova musa do poema.
nós
somos apenas pequenos garotos
brincando
no lixo atômico
-
palavras radioativas, dejetos.
quando
o poeta Tavinho Paes urinou sobre
o palco
do Teatro Municipal de São Paulo,
aquilo era poesia.
VII.
outro
dia me deparei com um desses
profetas
de rua
de
longos cabelos e barbas
- insanos -
bradando
aos ventos o fim dos tempos.
se em
vez dele, fosse você,
eu
acreditaria na profecia.
VIII.
utilidade pública:
trocamos
de lugar todas as placas
de
sinalização de trânsito,
e todas
as placas
de
nomenclatura das vias.
agora,
as ruas
estão tão cheias de poesia
que é
impossível não se desorientar
na
cidade.
IX.
poema relâmpago:
porque
todos os guarda-chuvas do mundo
nunca
serão suficientes.
então
eu te conduzo pela mão
para
dentro da tempestade
e fico
lá com você,
até o céu cansar de chover.
até o céu cansar de chover.
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